Entre o céu e a terra

Exposição da ‘AA contemporary Art Collection’, integrado no 15 anos de MACE, aqui somos rede. Elvas, Portugal, de 15 de Julho à 25 de Agosto.

Entre o céu e a terra.

O passado, a memória a experiência constituem esse funde de irrealidade que, semelhante a um feixe luminoso aclara este momento de agora, revela como é cheio de surpresa, como já se destina à memória e é já essa incontrolável gramática sonhadora.

Herberto Helder.

A cortina negra que se abre para o que as mãos não podem tocar. A nave da igreja das Domínicas, antes Senhora da Consolação, antes Templo dos Templários, antes pedra e cal, numa sucessão de tempos dentro do tempo, camadas sobrepostas, silenciosas, numa acumulação excessiva de despojos.

A profusão das cores dos azulejos, os dragões à solta pelas colunas, o rodopio dos anjos, a ostentação dourada da talha, altares. Sombras que se adivinham presas na eternidade.

Peças poisadas também elas capturadas pelo tempo, pele do que houver a sentir.

Objectos para a ocupação do espaço do tempo, espelhos para a criação de imagens, imagens de instantes que já são memória.

O mesmo rapto e clausura do momento, Contra a indiferença, o esquecimento, a banalização estéril fútil de imagens vaziass para coisa nenhuma.

O poder imortal da arte, O território do sagrado. Poder ser tocado pelo encantamento da alma.

Como escreve Rui Chafes O artista exprime o instinto espiritual da humanidade, traduz a tensão do homem em direcção ao eterno ou a uma qualquer forma de transcendência. A arte transporta em si uma nostalgia do ideal e exprime sempre a sua procura.

‘’Memórias dissolventes’’, etéreas, as balas que nos esperam e já ferem, o negro e o branco o hábito das domínicas no coro alto.

De imagem em imagem se transfere o corpo mutante das peças.

Lentamente. Demoradamente ouve o acordar de vozes submersas, percorre a coreografia da sombra do tempo, as palavras inscrita ‘’Num contínuo movimentos para chegar ao centro de si’’.

Copo, porta, Escada, Céu, Vento, Tempo.

Coreografia para uma impossível eternidade no território do sagrado.

E que possa ser sentida uma incontrolável gramática sonhadora.

Ana Antunes, 2022

Curadoria: AA Contemporary Arte Collection.