Inside-out, 2007

Inside-Out
Segui o fio das Parcas (as três fiandeiras, que tecem o tecido da vida e do destino dos homens), até ao tempo em que os vestidos serviam às bonecas. No processo, enquanto musculos, mãos e dedos trabalharam em conjunto, desenhando como uma tecedeira tece os tecidos, realizei que a História somente acumula; acontecimento sobre acontecimento, fio sobre fio, pedra sobre pedra. Ao (re)descobrir o caminho de volta no tempo, os vestidos constituiram uma teia subtil, em que o significado é contido e escondido. E agora, visto a lupa, a imagem por detrás do espelho não corresponde ao objecto reflectido: duplamente fragmentado como através de um prisma, numa escala ampliada (em imagens gémeas), o exterior espelhou o interior e o verso o reverso.

Identidade
O vestuário é visto como um sistema de significados densamente codificado, que transmite mensagens e que constroi a identidade a quem os veste. Os mantos e vestidos, como camadas protectoras, são lugares seguros de esconderijo e disfarce. Podemos ter múltiplos ‘corpos’ ou personalidades enquanto a verdadeira identidade entrelaça-se entre aquilo que somos e aquilo que aparentamos ser. Porque, além de serem uma necessidade física, as roupas revestem-se de valor simbólico, ritual ou religioso. Tecidos, comunicam poder e estatuto, bem como identidade política, social e cultural.

Presença e ausência
Os vestidos ganham significado por aquilo que revelam e por aquilo que escondem. O hábito e os nossos ‘costumes’ (tecidos, velados e vestidos) são como involúcros vazios presentes na sua materialidade, que remetem para a ausência do conteudo: o corpo (desfiado, revelado e despido), enquanto a alma desencontrada lhes imprime a sua forma. Talvez até numa dupla relação visto que “There is much to support the view that is clothes that wear us and not we them… they mold our hearts, our brains, our tongues to their liking”1

Padrão e rendilhado: Texto/textura/textil
Os vestidos e as palavras são produtos da relação (rendilhada) entre texto/textura/textil. Os elementos materiais, a gramática de que é feito o vestido; linha, costura, tecido, padrão, contam historias próprias. De facto, além de serem uma fonte metafórica para as artes, os texteis também são um meio comunicar através de narrativas visuais. A metáfora textil, preside sobre a criação do texto e este último pode ser apreendido, desdobrado e explicado, como tecido, (de acordo com Barthes’ conceito da ‘hyphologia’ o tecido e a teia de aranha). ‘Text means tissue; but wereas hitherto we have always taken this tissue as a product, a ready-made veil behind wich lies, more or less hidden, meaning (truth), we are now emphasizing, in this tissue, the generative idea that the text is made, is worked out in a perpetual interweaving; lost in this tissue-this texture-the Subject unmakes himself, like a spider dissolving in the constructive secretions of (her) web. Were we fond of neologisms, we might define the theory of the text as an hyphology (hyphos is the tissue and the spider web) 2 Literalmente e simbólico, aquilo, que é tecido, são redes de associações. Num significado mais amplo, (como Lévi-Strauss dizia) pode ser entendido como meio para ordenar, isto é, para organizar, relacionar e indexar. Selecionados e organizados os elementos a interligar, a repetição cria padrões e planifica a rede com significados. Propõe ao leitor/observador apanhar ‘o fio’ que o guia para frente e para trás, ligando os diferentes fragmentos espalhados. O tecido textual constitui um terreno rendilhado e acidentado. Os vazios são desenhados e fabricados, como através dos fios de renda, que integram os buracos na base da sua estrutura, e ao fazer também parte da obra, tornam-a simultâneamente fechada e aberta. Estes buracos, incorporados têm uma importância tipográfica e topográfica. O tecido com a suas formas, as linhas, os vazios entre as linhas, os padrões e as cores formam um meio de comunicar, de interligar e de associar. Faço minhas as palavras de Sandra Cisneros; The Universe is a cloth, and all humanity interwoven. Each and every person connected to me, and me connected to them, like the strans of a rebozo. Pull one string and the whole thing, comes undone. Each person who comes into my life, affecting the pattern, and me affecting theirs.

Inez Wijnhorst, Abril 2007

1. Virgínia Woolf
2 Roland Barthes, The pleasure of the text (New York: Hill and Wang, 1975)


Agradecimentos:
Casa das Artes Tavira.